quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Homilía Dominical dia 06/12/2015 - Lc 3,1-6

O Espírito do Batista!
Mons. José Maria Pereira 







Advento! Tempo de se preparar para acolher o Senhor que vem! Por mais escuro que esteja o horizonte à nossa frente, precisamos acreditar que dias melhores virão, pois Deus é fiel e não abandona seu povo.
Nesse segundo domingo do Advento, João Batista aparece como uma voz no deserto, fazendo um apelo à conversão, para preparar o caminho do Senhor!
Na linda da pregação de João Batista (cf. Lc 3, 1-6), acodem-me à mente as palavras do Profeta Isaías: “Uma voz exclama: abri no deserto um caminho para o Senhor [...]. Que todo vale seja aterrado, que toda montanha e colina sejam abaixadas... Subi a uma alta montanha, para anunciar a boa nova a Sião. Elevai com força a voz..., dizei às cidades de Judá: “Eis o vosso Deus!” (Is 40, 1-5.9-11).
Está na hora de retornar a boa notícia sobre Jesus Cristo, Filho de Deus, para gritá-la com força (é o sentido do Kerigma!) em Jerusalém e nas cidades de Judéia, isto é, na Igreja e fora da Igreja.
João Batista nos oferece um esplêndido exemplo de proclamação do Evangelho. O que o Batista compreendeu a respeito de Jesus é que se trata de alguém de que ele não é sequer digno de aproximar-se para desatar-lhe as sandálias; que é “o mais forte”, aquele que batizará no Espírito Santo e que desafiará, por assim dizer, o mundo a ferro e fogo!
João Batista teve a capacidade de fazer sentir Cristo “perto”, às portas (Jo 1,26), como alguém que está “no meio” dos homens e não como uma abstração mental; como alguém que já tem na mão a pá (Mt 3,12) e se apresenta para atuar o juízo, por isso não há mais tempo a perder. A força de seu anúncio estava em sua humildade (Jo 3,30): Importa que ele cresça e eu diminua, em sua austeridade e em sua coerência.
Hoje precisamos de anúncios inspirados e corajosos, como os de Isaías e de João Batista; diante deles o mundo não poderia ficar insensível, como acontece quando se fala de Jesus Cristo só com sabedoria de palavras, com livros que não acabam mais, mas sem a força e sem a coerência de vida.
Toda a essência da vida de João, desde o seio materno, esteve subordinada a essa missão! João se entrega totalmente nessa missão, dedicando-se a ela, não por gosto pessoal, mas por ter sido concebido para isso. E vai realizar a sua missão até o fim, até dar a vida, no cumprimento da sua vocação.
Foram muitos os que conheceram Jesus graças ao trabalho apostólico do Batista. Os primeiros discípulos seguiram Jesus por indicação expressa dele e muitos outros se prepararam interiormente para segui-Lo,, graças à sua pregação.
É bela a Vocação de João Batista! A vocação abarca a vida inteira e leva a fazer girar tudo em torno da missão divina. Cada homem, no seu lugar e dentro das suas próprias circunstâncias, tem uma vocação dada por Deus; de que ela se cumpra dependem outras coisas queridas pela vontade divina!
“Eu sou a voz que clama no deserto!” João Batista não é mais do que a voz, a voz que anuncia Jesus. Essa é a sua missão, a sua vida, a sua personalidade. Todo o seu ser está definido em função de Jesus, como teria que acontecer na nossa vida, na vida de qualquer cristão. O importante da nossa vida é Jesus!
À medida que Cristo se vai manifestando, João procura ficar em segundo plano, ir desaparecendo. Dizia São Gregório: “João Batista perseverou na santidade porque se conservou humilde no seu coração.”
Como precursor, indica-nos o caminho que devemos seguir! Na ação apostólica pessoal- enquanto preparamos os nossos amigos para que encontrem o Senhor-, devemos procurar não ser o centro. O importante é que Cristo seja anunciado, conhecido e amado.
Sem humildade, não poderíamos aproximar os nossos amigos de Deus. E então a nossa vida ficaria vazia.
Não somos apenas precursores! Somos também testemunhas de Cristo. Recebemos, com a graça batismal e a Crisma, o honroso dever de confessar a fé em Cristo, com as nossas ações e com a nossa palavra. Que tipo de testemunhas nós somos? Como é o nosso testemunho cristão entre os nossos colegas, na família?
Temos que dar testemunho e , ao mesmo tempo, apontar aos outros o caminho. “Também conduzir-nos de tal maneira que, ao ver-nos, os outros possam dizer: este é cristão porque não odeia, porque sabe compreender, porque não é fanático, porque está acima dos instintos, porque é sacrificado, porque manifesta sentimento de paz, porque ama” (É Cristo que passa, nº 122).
Nesse tempo do Advento, encontramos muitas pessoas olhando em outra direção, de onde não virá ninguém; ou onde outros estão debruçados sobre os bens materiais, como se fossem o seu último fim; mas eles jamais satisfarão o seu coração! Cabe a nós apontar-lhes o Caminho. A todos! Diz-nos Santo Agostinho: “Sabeis o que cada um de nós tem que fazer em casa, com o amigo, com o vizinho, com os dependentes, com o superior com o inferior. Não queirais, pois, viver tranquilos até conquistá-los para Cristo, porque vós fostes conquistados por Cristo.”
A nossa família, os amigos, os colegas de trabalho, as pessoas que vemos com frequência, devem ser os primeiros a beneficiar-se do nosso amor por Deus. Com o exemplo e com a oração, devemos chegar até mesmo àqueles com quem não temos ocasião de falar habitualmente, porém, não devemos nos esquecer que é a graça de Deus, não as nossas forças humanas, que consegue levar as almas ao Senhor!
Que o Senhor nos ilumine para descobrirmos, em nossa vida, quais as estradas tortuosas temos que endireitar para chegar até Ele. E quais os vales a preencher na vida profissional, na vida espiritual, na vida familiar, na vida de comunidade?
Possamos perceber que temos que abaixar nosso orgulho, nossa auto-suficiência!
Deus quer servir-se de nós para preparar os homens de hoje para a vinda de Cristo no Natal desse ano.
Temos o mesmo espírito de João Batista?
Para ilustrar a reflexão acrescento o texto de São Gregório Magno, doutor da Igreja (séc. XI); Sermão no Advento 20, 1-7: “Assim como está escrito no livro do Profeta Isaías: Esta é a voz daquele que grita no deserto: preparai o caminho do Senhor, endireitai suas veredas. Sendo perguntado ao glorioso Batista quem ele era, respondeu: eu sou a voz que grita no deserto. Por isso o profeta lhe chamou voz, porque ia à frente do Verbo. Todo aquele que anuncia a verdadeira fé as boas obras, que outra coisa faz senão preparar o caminho do Senhor que vem aos corações dos ouvintes? Porque formando com a palavra da santa pregação pensamentos limpos nas almas dos que o ouvem, faz com que a força da graça penetre, e a luz da verdade os ilumine, para que façam direitas as sendas por onde o Senhor há de vir, e em conformidade a isso disse: todo vale será aterrado, e todo desfiladeiro será humilhado.
Está muito claro nesta passagem do Evangelho que por vales não se identificam senão os humildes, e por montanhas e colinas quer que entendamos os soberbos. Vindo, pois, o Senhor nosso a nós, os vales muitos baixos foram cheios, e os montes e colinas soberbos foram humilhados; porque a voz de sua majestade assim o significou quando disse: quem se exaltar será humilhado, e quem se humilhar será exaltado...
E todo o povo observando que a vida do santo Batista era tão áspera, com tanta solidão e perfeição de penitência, acabaram por crer que ele fosse o Cristo. E vendo a nosso Senhor, que comia com os publicanos e conversava com os pecadores, não creram que ele fosse o Cristo, mas um profeta. Porém, passando o tempo, Cristo que era tido por profeta foi reconhecido como o Cristo verdadeiro, e o glorioso João, que era tido por Cristo, foi reconhecido como verdadeiro profeta, e assim se cumpriu o que o bem-aventurado Batista havia dito ao falar de Cristo: convém que ele cresça e eu diminua. Porque Cristo nosso redentor cresceu na reputação do povo, e foi conhecido pelo que era; e o santo precursor diminuiu, porque cessou de ser tido pelo que não era.
Vendo, pois, como o glorioso João perseverou na santidade, porque teve constância verdadeira na humildade de seu coração; e como muitos outros caíram, porque estavam cegos pelas vaidades e se ensoberbeceram dentro de si mesmos, digamos com razão que todos os vales serão cheios e todos os montes e colinas serão rebaixados, porque desce as mãos dos humildes as graças que os corações dos soberbos lançam para longe de si.
As passagens tortuosas serão endireitadas e os caminhos acidentados serão aplainados. Endireitam-se as coisas tortuosas quando os corações dos maus, torcidos
pelos pecados, endireitam-se por meio da penitência; e os lugares acidentados se tornam planos quando as almas cheias de soberba e de ira, recebendo a graça do Espírito Santo, tornam-se humildes e mansas; porque não é outra coisa a alma soberba não querer receber a palavra da verdade, senão um caminho áspero e pedregoso, que contradiz a que quer caminhar. E quando a alma do soberbo, aplainada pela virtude da mansidão, recebe com amor as palavras de repreensão e exortação, então dizemos que o pregador encontra o caminho plano, por onde primeiramente nem conseguia caminhar, impedido com a sua aspereza.
E toda a carne verá a salvação de Deus. Dizer toda a carne é o mesmo que se dissesse todos os homens. É fato que nem todos os homens puderam ver a Cristo na vida presente; diremos, pois, que a intenção do profeta nestas palavras é assinalar o dia do juízo, quando se verão os céus abertos, e virão os anjos por ministros, estarão os apóstolos sentados juntos, e aparecerá Cristo nosso Redentor, Juiz Soberano, sentado na sede de sua majestade, e todos os bons e maus o verão. E desta visão resultará que os bons gozem sem fim, recebendo o galardão de seus trabalhos; e os maus, castigados por suas próprias culpas, chorem para sempre os tormentos do inferno.”

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