DOMINGO DE RAMOS - ANO B
O Domingo de Ramos é a
grande porta de entrada na Semana Santa, a semana em que o Senhor Jesus caminha
até ao ponto culminante da sua existência terrena. Ele sobe a Jerusalém para
dar pleno cumprimento às Escrituras e ser pregado no lenho da Cruz, o Trono
donde reinará para sempre, atraindo a Si a humanidade de todos os tempos e
oferecendo a todos o dom da redenção. Jesus se encaminhou para Jerusalém
juntamente com os Doze e que, pouco a pouco, se foi unindo a eles uma multidão
cada vez maior de peregrinos. São Marcos refere que, já à saída de Jericó,
havia uma “grande multidão” que seguia Jesus (Mc 10, 46).
Em Mc 15,1-39, vemos que o cortejo organizou-se rapidamente.
Jesus faz a sua entrada em Jerusalém, como Messias, montado num burrinho,
conforme havia sido profetizado muitos séculos antes (Zac. 9,9). Jesus aceita a
homenagem, e quando os fariseus, que também conheciam as profecias, tentaram
sufocar aquelas manifestações de fé e alegria, o Senhor disse-lhes: “Eu vos
digo, se eles se calarem, as pedras gritarão.” (Lc 19, 40).
Nossa celebração de hoje,
inicia-se com o Hosana! E culmina no crucifica-o! Mas, este não é um
contrassenso; é, antes, o coração do mistério. O mistério que se quer proclamar
é este: Jesus se entregou voluntariamente a sua Paixão; não se sentiu esmagado
por forças maiores do que Ele (Ninguém me tira a vida, mas eu a dou por mim
mesmo: Jo 10,18); foi Ele que, perscrutando a vontade do Pai, compreendeu que
havia chegado a hora e a acolheu com a obediência livre do filho e com infinito
amor para os homens: “… sabendo Jesus que tinha chegado a sua hora, hora de
passar deste mundo para o Pai, tendo amado os seus que estavam no mundo,
amou-os até o fim” (Jo 13,1).
“Muitos estenderam seus
mantos pelo caminho....gritavam: “Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor!”
( Mc 11, 8 – 9). Perguntemo – nos: Que
pensavam, realmente, em seus corações aqueles que aclamam Cristo como Rei de
Israel? Certamente tinham a sua idéia própria do Messias, uma idéia do modo
como devia agir o Rei prometido pelos profetas e há muito esperado. Não foi por
acaso que a multidão em Jerusalém, poucos dias depois, em vez de aclamar Jesus,
grita para Pilatos: “Crucifica-O! ”, enquanto os próprios discípulos e os
outros que O tinham visto e ouvido ficam mudos e confusos.
Na realidade, a
maioria ficara desapontada com o modo escolhido por Jesus para Se apresentar
como Messias e Rei de Israel. É precisamente aqui que está o ponto central da
festa de hoje, mesmo para nós. Para nós, quem é Jesus de Nazaré? Que idéia
temos do Messias, que idéia temos de Deus? Esta é uma questão crucial, que não
podemos evitar, até porque, precisamente nesta semana, somos chamados a seguir
o nosso Rei que escolhe a Cruz como Trono; somos chamados a seguir um Messias
que não nos garante uma felicidade terrena fácil, mas a felicidade do Céu, a
bem-aventurança de Deus. Por isso devemos perguntar – nos: Quais são as nossas
reais expectativas? Quais são os desejos mais profundos que nos animaram a vir
aqui, hoje, celebrar o Domingo de Ramos e iniciar a Semana Santa?
Hoje Jesus quer também
entrar triunfante na vida dos homens, sobre uma montaria humilde: quer que
demos testemunho d’Ele com a simplicidade do nosso trabalho bem feito, com a
nossa alegria, com a nossa serenidade, com a nossa sincera preocupação pelos
outros. Quer fazer-se presente em nós através das circunstâncias do viver
humano. Naquele cortejo triunfal, quando Jesus vê a cidade de Jerusalém, chora!
Jesus vê como Jerusalém se afunda no pecado, na ignorância e na cegueira. O
Senhor vê como virão outros dias que já não serão como estes, um dia de alegria
e de salvação, mas de desgraça e ruína. Poucos anos depois a cidade será
arrasada. Jesus chora a impenitência de Jerusalém. Como são eloquentes estas
lágrimas de Cristo. O Concílio Vaticano II, G.S,nº 22, diz:
De certo modo, o
próprio Filho de Deus se uniu a cada homem pela sua Encarnação. Trabalhou com
mãos humanas, pensou com mente humana, amou com coração de homem. Nascido de
Maria Virgem, fez-se verdadeiramente um de nós, igual a nós em tudo, menos no
pecado. Cordeiro inocente, mereceu-nos a vida derramando livremente o seu
sangue, e n’Ele o próprio Deus nos reconciliou consigo e entre nós mesmos e nos
arrancou da escravidão do demônio e do pecado, e assim cada um de nós pode
dizer com o Apóstolo: “Ele me amou e se entregou por mim (Gal. 2,20)”.
A
história de cada homem é a história da contínua solicitude de Deus para com
ele. Cada homem é objeto da predileção do Senhor. Jesus tentou tudo com
Jerusalém, e a cidade não quis abrir as portas à misericórdia. É o profundo
mistério da liberdade humana, que tem a triste possibilidade de rejeitar a
graça divina. Como é que estamos correspondendo às inúmeras instâncias do
Espírito Santo para que sejamos santos no meio das nossas tarefas, no nosso
ambiente? Quantas vezes, em cada dia, dizemos sim a Deus e não ao egoísmo,à
preguiça, a tudo o que significa falta de amor, mesmo em pormenores
insignificantes?
A entrada triunfal de Jesus foi bastante efêmera para muitos.
Os ramos verdes murcharam rapidamente. O hosana entusiástico transformou-se,
cinco dias mais tarde, num grito furioso: Crucifica-o! Por que foi tão brusca a
mudança, por que tanta inconsistência? São Bernardo comenta: “Como eram
diferentes umas vozes e outras! Fora, fora, crucifica-o e bendito o que vem em
nome do Senhor, Hosana nas alturas! Como são diferentes as vozes que agora o
aclamam Rei de Israel e dentro de poucos dias dirão: Não temos outro rei além
de César! Como são diferentes os ramos verdes e a Cruz, as flores e os
espinhos!
Àquele a quem antes estendiam as próprias vestes, dali a pouco o
despojam das suas e lançam a sorte sobres elas.” A entrada triunfal de Jesus em
Jerusalém pede-nos coerência e perseverança,aprofundamento da nossa fidelidade,
para que os nossos propósitos não sejam luz que brilha momentaneamente e logo
se apaga. Muito dentro do nosso coração, há profundos contrastes: somos capazes
do melhor e do pior. Se queremos ter em nós a vida divina, triunfar com Cristo,
temos de ser constantes e matar pela penitência o que nos afasta de Deus e nos
impede de acompanhar o Senhor até a Cruz.
A Igreja nos lembra que a entrada
triunfal vai perpassar todos os passos da Paixão de Cristo. Terminada a
procissão, mergulha-se no mistério da Paixão de Jesus Cristo: Em Is 50 4-7
descreve o Servo sofredor, na esperança da vitória final. Vemos nele a própria
pessoa de Jesus Cristo. Em Fl 2,6-11 temos a chave principal de todo o mistério
deste Domingo de Ramos: Jesus humilhou-se e por isso Deus o exaltou! No texto
de Mc 15,1-39, somos chamados a contemplar a PAIXÃO e a MORTE de Jesus!
Que durante a Semana Santa possamos tirar muitos frutos da meditação da Paixão
de Cristo. Que em primeiro lugar tenhamos aversão ao pecado; possamos avivar o
nosso amor e afastar a tibieza!
Cabe
a nós escolher com que atitude queremos entrar na história da Paixão de Cristo:
com a atitude de Cirineu, que se coloca ao lado de Jesus, ombro a ombro, para
carregar com Ele o peso da cruz; com a atitude das mulheres que choram, do
centurião que bate no peito e de Maria que fica silenciosa ao pé da Cruz; ou se
queremos entrar com a atitude de Judas, de Pedro, de Pilatos e daqueles que
“olham de longe” para ver como irá terminar aquele episódio.
Toda nossa vida é, em certo
sentido, uma “semana santa” se a vivemos com coragem e fé, na espera do “oitavo
dia” que é o grande Domingo do repouso e da glória eterna. Neste tempo, Jesus nos
repete o convite que dirigiu a seus discípulos no Horto das Oliveiras: “Ficai
aqui e vigiai comigo” (Mc 14, 34; Mt 26,38).
Peçamos ao Senhor que nos
toque e abra os nossos corações a fim de que, seguindo a sua Cruz, sejamos
mensageiros do seu amor e da sua paz. A ascensão para junto de Deus passa
através da Cruz. É a subida para “o amor até ao fim” ( cf. Jo 13,1), que é o
verdadeiro monte de Deus, o lugar definitivo do contato entre Deus e o
homem.
O Domingo de Ramos diz – nos
que o verdadeiro grande “Sim” é precisamente a Cruz, que a Cruz é a verdadeira
Árvore da vida. Não encontramos a vida apoderando – nos dela, mas entregando –
a. O amor é um doar – se a si mesmo, e por isso é o caminho da vida verdadeira,
simbolizada pela Cruz.
MONSENHOR JOSÉ MARIA PEREIRA
SCE da Região Rio II
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