Os Mortos
não Voltam...
Mons. José Maria Pereira
O Evangelho (Lc 16, 19-31)
descreve-nos um homem que não soube tirar o proveito dos seus bens. Ao invés de
ganhar com eles o Céu, perdeu-o para sempre. Trata-se de um homem rico, que se
vestia de púrpura e de linho, e que todos os dias fazia festas esplêndidas;
muito perto dele, à sua porta, estava deitado um mendigo chamado Lázaro, todo
coberto de chagas, que desejava saciar-se com as migalhas que caíam da mesa do
rico. E até os cães lambiam as suas feridas.
A descrição que o Senhor nos
faz nesta parábola tem fortes contrastes: grande abundância num, extrema
necessidade no outro. O homem rico vive para si, como se Deus não existisse.
Esqueceu uma coisa que o Senhor recorda com muita freqüência: não somos donos
dos bens materiais, mas administradores.
O homem rico não está contra
Deus nem oprime o pobre! Apenas está cego para as necessidades alheias. O seu
pecado foi não ter visto Lázaro, a quem poderia ter feito feliz com um pouco
menos de egoísmo e um pouco mais de despreocupação pelas suas próprias coisas.
Não utilizou os bens conforme o querer de Deus. Não soube compartilhar. Santo
Agostinho comenta: “Não foi a pobreza que conduziu Lázaro ao Céu, mas a sua
humildade; nem foram as riquezas que impediram o rico de entrar no descanso
eterno, mas o seu egoísmo e a sua infidelidade.”
Do uso que façamos dos bens que
Deus depositou nas nossas mãos depende a vida eterna. Estamos num tempo de
merecer! Por isso, o Senhor nos dirá: “É melhor dar do que receber” (At 20,
25). Ganhamos mais dando do que recebendo: ganhamos o Céu! A caridade é sempre
realização do Reino dos Céus e é a única bagagem que restará neste mundo que
passa. E devemos estar atentos, pois Lázaro pode estar no nosso próprio lar, no
escritório ou na oficina em que trabalhamos.
A parábola ensina a
sobrevivência da alma após a morte e que, imediatamente depois da morte a alma
é julgada por Deus de todos os seus atos – juízo particular –, recebendo o
prêmio ou o castigo merecidos; que a Revelação divina é, de per si, suficiente
para que os homens creiam no mais além.
Também ensina que quem morre não
volta mais! Que não existe reencarnação! Quem salva o homem é Jesus Cristo, não
o próprio homem que vai pagando as suas faltas, cada vez que reencarna. Quem
tem fé em Cristo e o aceita como salvador rejeita o espiritismo e a sua
doutrina, a reencarnação. Em Hb 9, 27, diz o Senhor: “está determinado que os
homens morram uma só vez, e logo em seguida vem o juízo.”
“Entre vós e nós existe um abismo”, disse
Abraão ao rico, manifestando que depois da morte e ressurreição não haverá
lugar para penitência alguma. Nem os ímpios se arrependerão e entrarão no
Reino, nem os justos pecarão e descerão para o inferno. Este é um abismo
intransponível. Por isso se compreendem as palavras de São João Crisóstomo:
“Rogo-vos e peço-vos e, abraçado aos vossos pés, suplico-vos que, enquanto
gozemos desta pequena respiração da vida, nos arrependamos, nos convertamos, no
tornemos melhores, para que não nos lamentemos inutilmente como aquele rico
quando morrermos e o pranto não nos traga remédio algum. Porque ainda que
tenhas um pai ou um filho ou um amigo ou qualquer outro que tenha influência
diante de Deus, todavia, ninguém te livrará, sendo como são os teus próprios
fatos (atos) que te condenam.”
Exorta São Paulo em 1 Tm 6, 10:
“a raiz de todos os males é o amor ao dinheiro e que muitos perderam a fé por
causa disso.” O mesmo S. Paulo nos convida: “Combate o bom combate da fé,
conquista a vida eterna, para qual foste chamado...” (1 Tm 6, 12).
Nós fomos eleitos para ser
fermento que transforma e santifica as realidades terrenas. A sobriedade, a
temperança, o despreendimento hão de levar-nos ao mesmo tempo a sermos
generosos: ajudando os mais necessitados, levando adiante – com o nosso tempo,
com os talentos que recebemos de Deus, com os bens materiais na medida das
nossas possibilidades – obras boas, que elevem o nível de formação, de cultura,
de atendimento aos doentes... Ou seja, com o coração em Deus e voltado para o
próximo.
Não vos conformeis com este
mundo...” (Rm 12, 2). Quando se vive com o coração posto nos bens materiais, as
necessidades dos outros escapam-nos; é como se não existissem. O rico da
parábola “foi condenado porque nem sequer percebeu a presença de Lázaro, da
pessoa que se sentava à sua porta e desejava alimentar-se das migalhas que
caíam da sua mesa” ( Sto. Agostinho).
Façamos bom uso dos bens
materiais. Jesus vê na riqueza o perigo mais grave de auto-suficiência, de
afastamento de Deus e de insensibilidade para com o próximo.
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