O chamamento à conversão constitui o tema central do terceiro domingo da
Quaresma.
O Profeta Ezequiel diz: “Convertei-vos, senão vós morrereis” (Ez 33,11).
Deste modo uma questão se impõe: Que significa converter-se? Trata-se, antes de
tudo, da conformidade das ações com a vontade divina, à qual cumpre uma adesão
total. É a obediência da fé.
No texto de Ex3, 1-15 aparece indicado o relato da vocação de Moisés
para ser o guia do seu povo e organizar a sua saída do Egito. O êxodo do povo
escolhido é figura do itinerário de desapego e de conversão que o cristão está
chamado a realizar, de modo muito particular, no tempo da Quaresma.
O Papa Bento XVI assim se expressou: “converter-se significa não viver
como todo mundo vive, não fazer o que todo mundo faz, não se sentir justificado
fazendo ações duvidosas, ambíguas ou más pelo fato de que outros assim
procedem; começar a olhar a própria vida com os olhos de Deus, portanto,
procurar o bem, mesmo se isto contesta a sociedade. Não se submeter ao
julgamento dos homens, mas, sim, à avaliação de Deus, ou em outras palavras:
procurar um novo estilo de vida, uma vida nova”. Não se trata assim de um falso
moralismo, mas de não se perder de vista a essência da mensagem de Cristo,
mantendo firmemente o dom da nova amizade, o dom da comunhão com Jesus.
No Evangelho (Lc 13, 1-9) é forte o apelo à conversão: o texto fala de
dois acontecimentos trágicos daqueles dias: a matança de Pilatos… e a queda da
torre de Siloé: 18 mortos.
Jesus não concorda que a desgraça é sinal do castigo de Deus, pelo
contrário, é um apelo de conversão aos sobreviventes: “Vocês pensam que eles
eram mais pecadores do que vocês? Se vocês não se converterem, morrerão todos
do mesmo modo…” (Lc 13, 2-3). Palavras severas que nos fazem compreender que,
com Deus, não se pode brincar; e, no entanto, palavras que procedem do amor de
Deus que, por todos os meios, quer a salvação de todas as suas criaturas.
Conversão não é apenas uma penitência externa, ou um simples
arrependimento dos pecados; é um convite à mudança de vida, de mentalidade, de
atitudes, de forma que Deus e os seus valores passem a estar em primeiro lugar.
Significa abraçar a Cruz!
Já ensinava o Mestre: “Se alguém quiser vir após mim, renuncie a si
mesmo, tome a sua cruz e siga-me” (Mt 16,24). Não existe verdadeira conversão,
nem autêntico seguimento do Senhor sem a Cruz. As palavras de Jesus Cristo têm
plena vigência em todos os tempos, uma vez que foram dirigidas a todos os
homens, pois quem não carrega a sua cruz e me segue – diz – nos Ele a cada um –
não pode ser meu discípulo.
Carregar a Cruz – aceitar a dor e as contrariedades que Deus permite
para nossa purificação, cumprir com esforço os deveres próprios, assumir
voluntariamente a mortificação cristã – é condição indispensável para seguir o
Mestre.
“Que seria de um Evangelho, de um cristianismo sem Cruz, sem dor, sem o
sacrifício da dor?, perguntava-se o Papa Paulo VI. Seria um Evangelho, um
cristianismo sem Redenção, sem salvação, da qual – devemos reconhecê-lo com
plena sinceridade temos necessidade absoluta. O Senhor salvou-nos por meio da
Cruz; com a sua morte, devolveu-nos a esperança, o direito à vida…” Seria um
cristianismo desvirtuado que não serviria para alcançar o Céu, pois “o mundo
não pode salvar-se senão por meio da Cruz de Cristo” (São Leão Magno).
São Paulo escrevia que a Cruz é escândalo para os judeus, loucura para
os gentios (cf. 1Cor 1,23). E mesmo os
cristãos, na medida em que perdem o sentido sobrenatural das suas vidas, não conseguem
entender que só podemos seguir o Senhor através de uma vida de sacrifício,
junto da Cruz.
O Cristão que vive fugindo sistematicamente do sacrifício, que se
revolta com a dor, afasta-se também da santidade e da felicidade, que se
encontra muito perto da Cruz, muito perto de Cristo Redentor. “Se não te
mortificas, nunca serás alma de oração” (Caminho, 172). E Santa Teresa ensina:
“Pensar que (o Senhor) admite na sua amizade gente regalada e sem trabalhos é
disparate”.
Devemos perder o medo ao sacrifício, à mortificação voluntária, pois
quem quer a Cruz para cada um de nós é um Pai que nos ama e que sabe o que mais
nos convém.
O Senhor quer sempre o melhor para nós: “Vinde a mim todos os que estais
fatigados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei…” (Mt 11,28). Ao lado de
Cristo, as tribulações e penas não oprimem, não pesam, e, pelo contrário, levam
a alma a orar, a ver a Deus nos acontecimentos da vida.
Jesus expôs aos seus ouvintes a parábola da figueira estéril. Quando vai
buscar frutos, não os encontra. E o Senhor insiste na necessidade de produzir
frutos abundantes (Lc 8,11-15) correspondendo às graças recebidas (Lc 12,48).
Junto a este imperativo profundo, Jesus Cristo põe em relevo a paciência de
Deus, na espera desses frutos. Ele não quer a morte do pecador mas que se
converta e viva (Ez 33,11) e, como ensina São Paulo, “usa de paciência
convosco, não querendo que alguns pereçam, mas que todos cheguem à conversão”
(2Pd 3,9).Esta clemência divina, porém, não nos pode levar a descuidar os
nossos deveres, adotando uma posição de preguiça e de comodidade, que tornaria
estéril a própria vida. Deus, ainda que seja misericordioso, também é justo, e
castigará as faltas de correspondência à sua graça.
Ensinava São JosemariaEscrivá: “Há um caso que nos deve doer
sobremaneira: o daqueles cristãos que podiam dar mais e não se decidem; que
podiam entregar-se totalmente, vivendo todas as consequências da sua vocação de
filhos de Deus, mas resistem a ser generosos. Deve-nos doer, porque a graça da
Fé não se nos dá para ficar oculta, mas para brilhar diante dos homens (Mt 5,
15-16); porque, além disso, está em jogo a felicidade temporal e eterna dos que
procedem assim. A vida cristã é uma maravilha divina, com promessa de imediata
satisfação e serenidade, mas com a condição de sabermos apreciar o dom de Deus
(Jo 4,10), sendo generosos sem medida ” (Cristo que passa,147).
Rumo à Páscoa, o Senhor nos conceda a graça de uma verdadeira conversão!
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