Domingo
de Ramos
Mons.
José Maria Pereira
Com
a celebração do Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor, a Igreja abre a Semana
Santa. No
Evangelho ( Lc 23,1-49) vemos que o cortejo organizou-se rapidamente. Jesus faz a sua entrada em
Jerusalém, como Messias, montado num burrinho, conforme havia sido profetizado
muitos séculos antes (Zac. 9,9). Jesus aceita a homenagem, e quando os
fariseus, que também conheciam as profecias, tentaram sufocar aquelas
manifestações de fé e alegria, o Senhor disse-lhes: “Eu vos digo, se eles se
calarem, as pedras gritarão.” (Lc 19, 40).
Nossa
celebração de hoje inicia-se com o Hosana! E culmina no crucifica-o! Mas este
não é um contrassenso; é, antes, o coração do mistério. O mistério que se quer
proclamar é este: Jesus se entregou voluntariamente a sua Paixão; não se sentiu
esmagado por forças maiores do que Ele (Ninguém me tira a vida, mas eu a dou
por própria vontade: Jo 10,18); foi Ele que, perscrutando a vontade do Pai,
compreendeu que havia chegado a hora e a acolheu com a obediência livre do
filho e com infinito amor para os homens: “... sabendo Jesus que tinha chegado
a sua hora, hora de passar deste mundo para o Pai, tendo amado os seus que
estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1).
Hoje
Jesus quer também entrar triunfante na vida dos homens, sobre uma montaria
humilde: quer que demos testemunho d’Ele com a simplicidade do nosso trabalho
bem feito, com a nossa alegria, com a nossa serenidade, com a nossa sincera
preocupação pelos outros. Quer fazer-se presente em nós através das
circunstâncias do viver humano. Naquele
cortejo triunfal, quando Jesus vê a cidade de Jerusalém, chora! Jesus vê como
Jerusalém se afunda no pecado, na ignorância e na cegueira. O Senhor vê como
virão outros dias que já não serão como estes, um dia de alegria e de salvação,
mas de desgraça e ruína. Poucos anos depois a cidade será arrasada. Jesus chora
a impenitência de Jerusalém. Como são eloquentes estas lágrimas de Cristo. O
Concílio Vaticano II, G.S,nº 22, diz: De certo modo, o próprio Filho de Deus se
uniu a cada homem pela sua Encarnação. Trabalhou com mãos humanas, pensou com
mente humana, amou com coração de homem. Nascido de Maria Virgem, fez-se
verdadeiramente um de nós, igual a nós em tudo menos no pecado. Cordeiro
inocente, mereceu-nos a vida derramando livremente o seu sangue, e n’Ele o
próprio Deus nos reconciliou consigo e entre nós mesmos e nos arrancou da
escravidão do demônio e do pecado, e assim cada um de nós pode dizer com o
Apóstolo: “Ele me amou e se entregou por mim (Gal. 2,20)”. A
história de cada homem é a história da contínua solicitude de Deus para com
ele. Cada homem é objeto da predileção do Senhor. Jesus tentou tudo com
Jerusalém, e a cidade não quis abrir as portas à misericórdia. É o profundo
mistério da liberdade humana, que tem a triste possibilidade de rejeitar a
graça divina. Como
é que estamos correspondendo às inúmeras instâncias do Espírito Santo para que
sejamos santos no meio das nossas tarefas, no nosso ambiente? Quantas vezes em
cada dia dizemos sim a Deus e não ao egoísmo à preguiça, a tudo o que significa
falta de amor, mesmo em pormenores insignificantes? A
entrada triunfal de Jesus foi bastante efêmera para muitos. Os ramos verdes
murcharam rapidamente. O hosana entusiástico transformou-se, cinco dias mais
tarde, num grito furioso: Crucifica-o! Por que foi tão brusca a mudança, por
que tanta inconsistência? São
Bernardo comenta: “Como eram diferentes umas vozes e outras! Fora, fora,
crucifica-o e bendito o que vem em nome do Senhor, Hosana nas alturas! Como são
diferentes as vozes que agora o aclamam
Rei de Israel e dentro de poucos dias dirão: Não temos outro rei além de
César! Como são diferentes os ramos verdes e a Cruz, as flores e os espinhos!
Àquele a quem antes estendiam as próprias vestes, dali a pouco o despojam das
suas e lançam a sorte sobres elas.” A entrada
triunfal de Jesus em Jerusalém pede-nos coerência e perseverança,aprofundamento
da nossa fidelidade, para que os nossos propósitos não sejam luz que brilha
momentaneamente e logo se apaga. Muito dentro do nosso coração, há profundos
contrastes: somos capazes do melhor e do pior. Se queremos ter em nós a vida
divina, triunfar com Cristo, temos de ser constantes e matar pela penitência o
que nos afasta de Deus e nos impede de acompanhar o Senhor até a Cruz. A
Igreja nos lembra que a entrada triunfal vai perpassar todos os passos da
Paixão de Cristo. Terminada a procissão mergulha-se no mistério da Paixão de
Jesus Cristo: Em Is 50 4-7 descreve o Servo sofredor, na esperança da vitória
final. Vemos nele a própria pessoa de Jesus Cristo. Em Fl 2,6-11 temos a chave
principal de todo o mistério deste Domingo de Ramos: Jesus humilhou-se e por
isso Deus o exaltou! No
texto de Mc 15,1-39, somos chamados a
contemplar a PAIXÃO e a MORTE de Jesus. Que durante a Semana Santa possamos
tirar muitos frutos da meditação da Paixão de Cristo. Que em primeiro lugar
tenhamos aversão ao pecado; possamos avivar o nosso amor e afastar a tibieza!
Cabe a nós escolher com que atitude
queremos entrar na história da Paixão de Cristo: com a atitude de Cirineu, que
se coloca ao lado de Jesus, ombro a ombro, para carregar com Ele o peso da
cruz; com a atitude das mulheres que choram, do centurião que bate no peito e
de Maria que fica silenciosa ao pé da cruz; ou se queremos entrar com a atitude
de Judas, de Pedro, de Pilatos e daqueles que “olham de longe” para ver como
irá terminar aquele episódio.
Toda
nossa vida é, em certo sentido, uma “semana santa” se a vivemos com coragem e
fé, na espera do “oitavo dia” que é o grande Domingo do repouso e da glória
eterna.
Neste
tempo, Jesus nos repete o convite que dirigiu a seus discípulos no Horto das
Oliveiras: “Ficai aqui e vigiai comigo” (Mc 14, 34; Mt 26,38).
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