A FÉ DE TOMÉ
Mons. José Maria Pereira
Nestes dias de Páscoa a Liturgia nos fez
assistir ao nascimento da fé pascal. Mediante a narração das aparições do
Ressuscitado, vimos renascer nos discípulos de Jesus, desanimados e dispersos,
a fé e o amor para com Ele: a ressurreição gerou a fé.
Cristo ressuscitado é a razão de ser de
nossa existência. Celebrar essa história é motivo de grande alegria para os
cristãos.
O evangelho ( Jo 20, 19-31) inicia falando do
primeiro dia da semana, isto é o Dia por excelência, pois foi o dia da
Ressurreição do Senhor.
“Ao anoitecer
daquele dia, o primeiro da semana” ( Jo 20,19), Jesus veio confortar os amigos
mais íntimos: A paz esteja convosco, disse-lhes. Depois mostrou-lhes as mãos e
o lado. Nesta ocasião, Tomé não estava com os demais Apóstolos; não pôde, pois,
ver o Senhor nem ouvir as suas palavras consoladoras.
Imagino os
Apóstolos cheios de júbilo procurando Tomé para contar-lhe que tinham visto o
Senhor! Mal o encontraram, disseram-lhe: Vimos o Senhor! Tomé continuava
profundamente abalado com a crucifixão e a morte do Mestre; quer ver para crer!
Acredito que os Apóstolos devem ter-lhe repetido, de mil maneiras diferentes, a
mesma verdade que era agora a sua alegria e a sua certeza: Vimos o Senhor!
Hoje nós temos que
fazer o mesmo! Para muitos homens e para muitas mulheres, é como se Cristo
estivesse morto, porque pouco significa para eles e quase não conta nas suas
vidas. A nossa fé em Cristo ressuscitado anima-nos a ir ao encontro dessas
pessoas e a dizer-lhes, de mil maneiras, diferentes que Cristo vive, que
estamos unidos a Ele pela fé e permanecemos com Ele todos os dias, que Ele
orienta e dá sentido à nossa vida.
Desta maneira, cumprindo essa exigência da fé
que é difundi-la com o exemplo e a palavra, contribuímos pessoalmente para a
edificação da Igreja, como aqueles primeiros cristãos de que falam os Atos dos
Apóstolos: “Cada vez mais aumentava o número dos homens e mulheres que
acreditavam no Senhor” (At. 5,14).
Oito dias depois
Jesus apareceu aos Apóstolos novamente e agora Tomé também estava; Jesus disse:
“A paz esteja convosco. Depois disse a Tomé: Mete aqui o teu dedo e vê as
minhas mãos..., não sejas incrédulo, mas fiel (Jo 20,26-27).
A resposta de Tomé
é um ato de fé, de adoração e de entrega sem limites: Meu Senhor e meu Deus! A
fé do Apóstolo brota não tanto da evidência de Jesus, mas de uma dor imensa. O
que o levou a adoração e ao retorno ao apostolado não são tanto as provas como
o amor. Diz a Tradição que o Apóstolo Tomé morreu mártir pela fé no seu Senhor;
consumiu a vida a seu serviço.
As dúvidas de Tomé
viriam a servir para confirmar a fé dos que mais tarde haviam de crer n’Ele.
Comenta São Gregório Magno: “Porventura pensais que foi um simples acaso que
aquele discípulo escolhido estivesse ausente, e que depois, ao voltar, ouvisse
relatar a aparição e, ao ouvir, duvidasse, e, duvidando, apalpasse, e,
apalpando acreditasse? Não foi por acaso, mas por disposição divina que isso
aconteceu. A divina clemência agiu de modo admirável quando este discípulo que
duvidava tocou as feridas das carnes do seu Mestre, pois assim curava em nós as
chagas da incredulidade... Foi assim, duvidando e tocando, que o discípulo se
tornou testemunha da verdadeira ressurreição”.
Peçamos ao Senhor
que aumente em nós a fé, pois se a nossa fé for firme, também haverá muitos que
se apoiarão nela.
A virtude da fé é a que nos dá a verdadeira
dimensão dos acontecimentos e a que nos permite julgar retamente todas as
coisas. Somente com a luz da fé e a meditação da palavra divina é que é
possível reconhecer Deus sempre e por toda a parte, esse Deus em quem vivemos e
nos movemos e existimos (At 17,28).
Meu Senhor e meu Deus! Estas palavras têm
servido de jaculatória a muitos cristãos, e como ato de fé na presença real de
Jesus Cristo na Eucaristia, quando se passa diante de um Sacrário ou no momento
da Consagração na Missa.
A Ressurreição do Senhor é um apelo para
que manifestemos com a nossa vida que Ele vive. As obras do cristão devem ser
fruto e manifestação de sua fé em Cristo. Hoje também o Senhor quer que o
mundo, a rua, o trabalho, as famílias sejam veículo para a transmissão da
fé.
A fé em Cristo era a força que congregava os
primitivos cristãos numa coesão perfeita de sentimentos e de vida: “A multidão
dos que abraçavam a fé tinha um só coração e uma só alma” (At. 4,32). Era uma
fé tão arraigada que os levava a renunciar, voluntariamente, aos próprios bens,
para colocá-los à disposição dos mais necessitados, considerados
verdadeiramente irmãos em Cristo. É esta fé que hoje é tão escassa; para muitos
que dizem ser crente, a fé não exerce influência alguma nos seus costumes nem
na sua vida. Um cristianismo assim, não convence nem converte o mundo. É
preciso voltar a acomodar a própria fé ao exemplo da Igreja primitiva; é
preciso pedir a Deus uma fé profunda, pois que, no poder da fé, está a certeza
da vitória dos cristãos. “Esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé! Quem
é que vence o mundo senão Aquele que crê que Jesus é Filho de Deus?” ( 1 Jo 5,4-5).
Oito dias depois da Páscoa, os discípulos
estavam em casa quando Jesus veio, estando fechadas as portas, parou no meio
deles e disse: “A paz esteja convosco!” Também agora, na nossa assembleia,
Jesus vem em nosso meio e nos dá sua paz. Nós,como Tomé, O reconhecemos como
nosso Senhor e nosso Deus. Rezemos para que Ele faça de nós uma verdadeira
comunidade reunida em Seu nome.