O Tesouro Escondido
Mons. José Maria Pereira
O
Evangelho (Mt 13,44-52) continua a série de parábolas sobre o Reino dos Céus. O
ensinamento de Jesus é particularmente vivo e apto para mover a mente e o
coração e, por conseguinte, para levar à ação. Jesus compara o Reino dos Céus “a
um tesouro escondido no campo. Um homem o encontra e o mantém escondido. Cheio
de alegria, ele vai, vende todos os seus bens e compra aquele campo” (Mt
13,44). Ou ainda, “a um negociante que andava em busca de pérolas preciosas. Ao
encontrar uma de grande valor, ele vai, vende todos os seus bens e compra
aquela pérola” (Mt 13, 45-46). Nos dois casos, por duas vezes, se fala em
vender: vender significa desfazer-se do que é seu. Para possuir o Reino dos
Céus as pessoas deverão desfazer-se de si mesmas, dos valores falsos deste
mundo, do apego aos bens materiais. Vale apena vender tudo para possuir o
tesouro do Reino! O Reino dos Céus – o Evangelho, o cristianismo, a graça, a
amizade com Deus – é o tesouro escondido, mas presente no mundo; muitos o têm
próximo, mas não o descobrem, ou antes, mesmo descoberto, não sabem dar-lhe o
respectivo valor e descuidam-no, preterindo-o ao reino material: aos prazeres,
às riquezas e às satisfações de vida terrena. Somente quem dispõe de um coração
compreensivo para “distinguir o bem do mal” (1Rs 3,9), o eterno do transitório,
a aparência do que é essencial, saberá tomar a decisão de “vender tudo quanto
possui” para o adquirir. Jesus não pede pouco a quem quer alcançar o Reino;
pede-lhe tudo. Mas também é certo que não lhe promete pouco; promete-lhe tudo:
a vida eterna e a eterna e beatificante comunhão com Deus. Se o homem, para
conservar a vida terrena, está disposto a perder a todos os seus bens, porque
não se dispõe a fazer outro tanto, ou mais ainda, para conseguir para si a vida
eterna?
Nas duas parábolas, mesmo sendo
parecidas entre si, apresentam diferenças dignas de nota: O tesouro significa a
abundância de dons; a pérola, a beleza do Reino. O tesouro apresenta-se de
repente, a pérola supõe, pelo contrário, uma busca esforçada; mas em ambos os
casos o que encontra fica inundado de uma profunda alegria. Assim é a fé, a
vocação, a verdadeira sabedoria, o desejo do céu: por vezes, apresenta-se de
modo inesperado, outras segue-se a uma intensa busca. A atitude do homem, em
ambas as parábolas, está descrita com os mesmos termos: “vai e vende tudo o
quanto tem e compra-a: o desprendimento, a generosidade, é condição
indispensável para o alcançar.
“O Reino dos Céus é ainda como uma
rede lançada ao mar que apanha peixes de todo o tipo” (Mt13,47). Esta rede
lançada ao mar é imagem da Igreja, em cujo seio há justos e pecadores: até o
fim dos tempos, haverá nela santos, como haverá os que abandonaram a casa
paterna, dilapidando a herança recebida no Batismo; e uns e outros pertencem a
ela, ainda que de modo diverso.
Como recordou São João Paulo II, a Igreja “é Mãe, na qual
renascemos para uma vida nova em Deus; uma mãe deve ser amada. Ela é santa no
seu Fundador, nos seus meios e na sua doutrina, mas formada por homens
pecadores; temos que contribuir para melhorá-la e ajudá-la a uma fidelidade
sempre renovada, que não se consegue com críticas corrosivas” (Homilia em
Barcelona, 1982).
A
Igreja é fonte de santidade e causa da existência de tantos santos ao longo dos
séculos.
Todos
os membros da Igreja são chamados à santidade, “quer pertençam à Hierarquia,
quer sejam por ela apascentados” (LG, 39).
Peçamos
ao Senhor que nós, membros do Povo de Deus, do seu Corpo Místico, cresçamos em
santidade pessoal e sejamos assim bons filhos da Igreja. “São precisos – disse São
João Paulo II – arautos do Evangelho, peritos em humanidade que conheçam
a fundo o coração do homem de hoje, participem das suas alegrias e esperanças,
das suas angústias e tristezas e ao mesmo tempo, sejam contemplativos,
enamorados de Deus. Para isto, são precisos novos santos. Os grandes
evangelizadores da Europa foram os santos. Devemos suplicar ao Senhor que
aumente o espírito de santidade na Igreja e nos envie novos santos para evangelizar
o mundo de hoje” (Discurso ao Simpósio de Bispos Europeus, 1985).
Amemos,
cada vez mais, a Igreja de Cristo! Se amamos a Igreja, nunca surgirá em nós
esse interesse mórbido em ventilar, como culpa da Mãe, as misérias de alguns
dos filhos.
Façamos
nossa a oração de Salomão: “Senhor, dá, pois, ao teu servo um coração
compreensivo, capaz de governar o teu povo e de discernir entre o bem e o mal”
(1Rs 3,9). Que na procura do Tesouro e da Pérola Preciosa, os obstáculos nunca
nos desanimem, “pois, tudo contribui para o bem daqueles que amam a Deus...” (Rm
8, 28).